O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, voltou a defender nesta quinta-feira (20) a regulamentação das empresas digitais, durante almoço, em Brasília, com os principais publishers e executivos de veículos jornalísticos brasileiros, promovido pela Associação Nacional de Jornais (ANJ). Segundo ele, essa é uma tarefa a ser feita pelo Legislativo brasileiro que, no entanto, pode ser efetivada pelo STF, caso não seja aprovada no Parlamento.

Barroso disse acreditar que as grandes plataformas vivem uma crise de credibilidade que pode abrir caminho para uma reocupação do espaço do jornalismo profissional como mediador dos fatos, a partir da pluralidade e da busca pela verdade.

De acordo com ele, a terceira revolução digital – a da tecnologia analógica para a digital – resultou numa nova economia de profundos impactos na comunicação social. Do ponto de vista positivo, disse o ministro, esse processo representa uma democratização da comunicação.

Por outro lado, continuou Barroso, abriu caminho para a desinformação e o discurso de ódio, fortaleceu o viés de confirmação e gerou uma crise no modelo de negócios do jornalismo profissional, com a maior parte da publicidade migrando para as companhias digitais.

Para o ministro, a regulamentação deve regrar os direitos autorais, o uso de dados individuais, o conteúdo e o comportamento. O presidente do STF disse que o atual ecossistema de comunicação abre caminho para “estratégias cujo objetivo é amplificar a desinformação” nas redes sociais. “Aí vira um problema de saúde pública”, destacou Barroso.

Assimetria

O presidente-executivo da ANJ, o jornalista Marcelo Rech, por sua vez, ressaltou que a atividade jornalística, tão essencial para a democracia, está sob ameaça. “A começar pela chamada desmonetização do jornalismo produzida por gigantescos grupos internacionais de comunicação digital”, disse.

“Valendo-se de conteúdos de terceiros, as chamadas big techs acumulam fortunas vendendo publicidade, mas não querem ser equiparadas em regulação aos veículos de comunicação”, afirmou.

Rech lembrou que está em análise no STF o artigo 19 do Marco Civil da Internet. “Estamos na expectativa de que a Corte defina com clareza a constitucionalidade e o alcance desse artigo, que virtualmente isenta algumas das maiores empresas do mundo de qualquer responsabilidade pelo produto que vendem”, enfatizou.

De acordo com o presidente-executivo da ANJ, essa assimetria com os meios de comunicação, que inclui aspectos regulatórios e o uso de conteúdos jornalísticos sem a devida remuneração, “está na raiz de grande parte dos percalços do jornalismo, o que só tende a se agravar agora com a atuação descontrolada da inteligência artificial generativa”.

Rech afirmou que a ameaça à própria existência da imprensa pode ser equacionada com o reequilíbrio das relações econômicas. Ele lembrou que, em alguns países democráticos, como na Austrália e no Canadá, há avanços significativos, com apoio dos demais poderes. “No Brasil, esse tema segue engessado por lobbies poderosos que não querem uma discussão racional e produtiva sobre a revitalização do jornalismo profissional como melhor antídoto para a epidemia desinformativa”, disse.

Censura

O presidente-executivo da ANJ também enfatizou que o setor vê com preocupação a recente decisão da Suprema Corte de responsabilizar os veículos jornalísticos por entrevistas de terceiros, em caso envolvendo o Diário de Pernambuco.

Os veículos jornalísticos brasileiros defendem a tese de Barroso, segundo a qual “a única coisa que se pune em termos de liberdade de expressão e imprensa é a veiculação de má-fé, por intencionalidade de prejudicar ou por absurda negligência em apurar a verdade”.

“Seguramente, os veículos aqui presentes também pregam interna e externamente essa conduta. Por isso, na redação final da tese, esperamos e torcemos, junto com o jornalismo livre e responsável, para que sua voz seja ouvida e que não sejam criadas novas sombras à liberdade de imprensa”, disse Rech.

Foto: Augusto Coelho-Comunicamera