O ESTADO DE S.PAULO

Mauricio Moura

A eleição presidencial americana de 2016 foi o baile de debutante para as fake news distribuídas de forma massiva pelas redes sociais e com utilização de inteligência artificial. A onda se espalhou e rapidamente se globalizou. Quase impossível identificar uma eleição majoritária (em qualquer parte do mundo) que não tenha fake news desfilando pelos telefones celulares dos eleitores. Diante disso, o que mudou em 2020, o que permaneceu e o que a política do país mais rico do mundo pode esperar para o futuro pós-eleição presidencial?

Primeiro, as pessoas comuns seguem compartilhando alucinadamente e ajudam a inflar o espaço das notícias falsas. Pesquisadores do Massachusetts Institute of Tecnology (MIT), nos EUA, demonstraram que é muito maior a chance de uma notícia falsa ser repassada (70%) do que uma notícia verdadeira. Com isso, testemunhamos essas falsas publicações se multiplicarem em correlação positiva com o maior surgimento de meios de comunicação tendenciosos e instrumentalizados, principalmente os digitais (blogs/sites e derivados).

Se em 2016 a principal plataforma de disseminação de desinformação foi o Facebook, este ano o monopólio foi quebrado. Entraram o Instagram, Tiktok, Youtube e mensagens de texto via celular. Nos EUA, o Whatsapp tem um papel coadjuvante na comunicação comparado ao Brasil ou Índia. Nesse contexto, vale mencionar que grandes empresas de tecnologia nunca estiveram tão pressionadas para anestesiar a publicação e divulgação de fake news. Muito conteúdo foi tirado do ar (diferente de 2016). Mas os críticos alegam que ainda estamos enxugando o gelo nesse quesito.

Também mudou o protagonismo do conteúdo falso. Todos lembram que na campanha anterior Hillary Clinton foi o principal alvo das fake news. Em 2020, o eleito desse ciclo presidencial foi o voto pelo correio. Pesquisadores americanos identificaram milhares de vídeos/conteúdos claramente falsos e mal-intencionados sobre o tema. Lembrando que em razão da pandemia, os americanos quebraram todos os recordes de voto pelo correio. Alvo ideal para a desinformação em massa.

Além disso, para piorar, as autoridades de inteligência locais (assim como comprovado em 2016 com uso de notícias falsas) identificaram interferência estrangeira (vindas de Rússia, Irã e China) no processo eleitoral. Um tiro na credibilidade da democracia americana.

E pior é imaginar que o futuro próximo não parece ser muito diferente, pois os fundamentos das fake news seguem sólidos. Os EUA continuarão sendo um país polarizado, a tecnologia seguirá avançando mais rápido que as regulações e os eleitores seguirão (se não educados) a compartilhar conteúdo falso sem remorso. Resta torcer para que a próxima gestão da Casa Branca contribua mais para ajudar o público a distinguir entre “fake news” e conteúdo que “os políticos não gostam”.

É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE GEORGE WASHINGTON E PRESIDENTE DO INSTITUTO DE PESQUISA IDEA BIG DATA